De 21 a 24 de novembro, João Pessoa vai sediar o maior encontro de pesquisadores, escritores e historiadores da cultura nordestina e o ex-ministro José Américo de Almeida e o seu papel na Revolta de Princesa e no combate ao cangaço será debatido de forma inédita devido às abordagens prometidas.
O pesquisador e historiador pombalense José Tavares não estará presente por motivos particulares, mas o blog publica a seguir artigo de sua autoria que fará parte do seu livro sobre A Revolta de Princesa, a ser publicado em 2025.
A seguir, a chegada de zé Américo no oblast de Princesa.
A CHEGADA DE JOSÉ AMÉRICO AO PALCO DOS ACONTECIMENTOS
Jose Tavares de Araujo NetoEm meados do mês de abril daquele ano de 1930, portanto, cerca de um mês e meio do início da
sedição, por sugestão do paraibano Assis Chateaubriand, o jornalista Victor do Espírito Santo veio do Rio de Janeiro até a Paraíba, a fim de cobrir in loco o movimento armado que estava acontecendo na região de Princesa.
Neste intuito, depois de chegar a Recife, o jornalista seguiu até a capital paraibana, onde se fez acompanhar pelo seu colega norte-rio-grandense Café Filho, que se encontrava refugiado naquela cidade, por conta de questões políticas com o presidente do seu Estado, Juvenal Lamartine de Faria.
“A primeira pessoa conhecida que encontrei na capital paraibana, depois que me desfiz da bagagem, foi Café Filho, que, emigrado do Rio Grande do Norte, onde Juvenal Lamartine decretara sua morte, fora carinhosamente acolhido pelo povo paraibano.
Uma advertência de Café Filho, na ocasião, foi também decisiva para a minha orientação seguinte:
– João Pessoa está sendo enganado pelos seus auxiliares imediatos. José Américo, presentemente no Rio, em defesa dos interesses e da autonomia do Estado, faz-lhe grande falta. É o único secretário de Estado que tem autoridade e coragem para dizer-lhe a verdade. A situação é calamitosa, mas João Pessoa está certo de que singra por mares favoráveis. Você prestará um grande serviço à Paraíba e a João Pessoa se depois de visitar as posições legais fizer um relato verdadeiro, real de tudo aquilo que ver. Procure-o antes também de voltar para o sertão.”
Revoltosos de Princesa em torno do Cel, Zé Pereira
Café Filho levou o seu colega até a presença do presidente, fazendo-o prometer de que iria retornar ao gabinete presidencial para relatar tudo o que presenciou em Princesa.
“Depois de visitar o quartel general das forças fieis ao governo, voltei à presença de João Pessoa para dizer-lhe o que vira, o que sentira, o que observara nesse giro, feito em companhia de Café Filho.
Disse-lhe que encontrara no caminho numerosos desertores que, abandonando as armas que o governo lhes confiara, fugiam apavorados dos campos de operações. Fiz-lhe ver que o comandante das tropas legais não estava à altura do cometimento. Era um oficial valoroso, mas sem
qualidades para tão espinhoso mister. Queria impor disciplina a poder de bofetadas. Seu imediato, dominado pela malária, vivia em permanente tremedeira; tremuras que eu não sabia se eram apenas devidas à doença… Além de faltar-lhes tudo, as tropas do governo não tinham organização nem disciplina. Estavam sem moral.
Fui de certa maneira cruel ao fazer todas aquelas revelações, tanto mais que o comandante era amigo pessoal do presidente, mas era essa crueldade era necessária, se impunha.
Sem demora, chamando à sua presença o sr. Ademar Vidal, que respondia por duas Secretarias, dada a ausência de José Américo de Almeida, João Pessoa determinou providências imediatas, capazes de evitar a debacle total. Mandou que se chamasse sem demora do Rio, José Américo de Almeida, para assumir desde logo o comando da resistência.”
João Pessoa convoca de Zé Américo
José Américo de Almeida, que havia sido o candidato a deputado federal mais votado, encontrava-se no Rio de janeiro. A justiça eleitoral da Paraíba havia anulado grande parte dos votos obtidos pelos candidatos a senado e a deputado federal da Aliança Liberal, concedendo diplomas aos seus opositores, aliados do presidente da República. Apesar de tentar, José Américo não obteve sucesso. A justiça federal ratificou a decisão do juiz eleitoral paraibano. Foi neste momento que o presidente João Pessoa convocou José Américo para lhe auxiliar no caso de Princesa. Ele não confiava nos correios que era\ controlado pelo governo federal. Mandou o recado pelo jornalista Víctor do Espirito que estava de regresso a capital federal.
“Eu ainda estava no Rio, quando Victor do Espírito Santo que, numa proeza de reportagem, penetrara em Princesa e visitara depois as posições das forças que defendiam o governo do Estado, pintara esse contraste: “O reduto rebelde surpreendeu-me por sua organização e pelo espírito combativo, ao passo que do outro lado tudo era sinal de derrota”.
Foi mais explicito: “Seguro da vitória, José Pereira já tinha estudado seus planos de ataque à Patos, à Piancó e à Capital do Estado”. Fora-lhe facilitado o exame do almoxarifado, em Princesa, “pejado de armas e munição”.
Quanto às posições dos legalistas, assim se exprimira: “Não se descreve o que observei, até Olho d’Água, onde se achava o PC do comando geral: deserções, xadrezes superlotados, necessidades de toda ordem”.
Concluiu: “Não pude dizer isso pelos jornais para não prejudicar a causa, mas, vendo que João Pessoa era trazido enganado, impus-me a ingrata tarefa de relatar-lhe o que presenciara. Ele desconhecia a situação deplorável a
que chegara a defesa do Estado e mostrou-se indignado com os que lhe escondiam a verdade. Atribui tudo à sua ausência e mandou-lhe um recado. Quer que volte o quanto antes”.
“Ninguém se perde na volta. Voltar é uma forma de renascer”.
Oferta para assumir pasta da Segurança
“João Pessoa ofereceu-me a Secretaria de Segurança Pública, ocupada por Ademar Vidal.
Para concorrer à eleição eu tivera de deixar a Secretaria do Interior e, não tendo sido reconhecido, só desejava descanso. Vinha livre.
A polícia era um lugar de que eu gostava, por seus contatos com a vida. Nas minhas passagens eventuais por esse setor, desenvolvera uma ação social e humana que os demais não comportavam. Exercitara faculdades que me seriam úteis em outras circunstâncias. Agora, esbulhado, meu interesse era reassumir o cargo vitalício de Consultor Jurídico do Estado e voltar à minha banca de advogado que, dando um pontapé na fortuna, trocara pela política. Iria tratar de minha vida.
Fui para casa estudar uma resposta”.
José Americo diz sim ao convite de João Pessoa para o cargo de Secretário de Segurança Pública e se propõe a dirigir a campanha pessoalmente no centro de operações, em Piancó:
“Estava tão envolvido pelos acontecimentos que a recusa, quando tudo perigava, poderia parecer comodismo. Só sabia viver todo apagado ou trepidante.
Somente João Pessoa poderia desobrigar-me. Eu ganhara uma grande amizade e tinha que retribuí-la.
Feito o ato, desdobrei-me em providências e as ordens expedidas não davam resultado; meu nome estava em jogo.
Só a visão direta evitaria um colapso. Andava nessa causa aos trancos e barrancos, estava por assim dizer, nas últimas e nada se sabia de positivo. Manifestei a João Pessoa o propósito em que estava de ir dirigir a campanha no centro de operações, em Piancó. Ele desaconselhou e, como eu insistisse, acabou proibindo. Opôs-se terminantemente:
– Não senhor. Não permito isso.
José Tavares, pesquisador e historiador
Compenetrado de que era o que me competia, voltei à carga:
– Que é que eu estou fazendo aqui? Quer saber de uma coisa? Ou vou ou abandono o lugar. Tenho que ir.
Mostrando o que valeria o ato de presença,’ assegurei-lhe que iria apenas deitar uma vista de olhos na situação e, o que mais convinha, representar a autoridade única, corrigindo os distúrbios causados pela rivalidade entre os comandos. Não iria praticar bravatas; não cairia nesse ridículo.
Não chegou a assentir; calou-se, contrariado.
Eu ia levar a luta às suas últimas consequências