O presidente Luiz Inácio Lula da Silva mandou suspender a implantação da reforma em curso do Novo Ensino Médio, após pressão de professores e entidades ligadas à Educação. Sua implementação já estava em curso desde o governo do tenente Messias Bolsonaro. Educadores e estudantes afirmam que, ao contrário da propaganda, o Novo Ensino Médio precariza ainda mais a formação dos alunos e aprofunda desigualdades. O blog reproduz a seguir reportagem de Marcelo Heiler para o site Revista Fórum.
Para os educadores o NEM é um “retrocesso” e aprofunda desigualdades entre os estudantes brasileiros, pois, da maneira como está o Novo Ensino Médio tem privilegiado disciplinas como “finanças”, “empreendedorismo” em detrimento de clássicas disciplinas com filosofia e sociologia, fundamentais no desenvolvimento crítico dos estudantes.
Mas do que se trata o Novo Ensino Médio? Com o objetivo de semear a discussão e tirar dúvidas sobre este polêmico projeto educacional, abaixo elencamos as principais perguntas e dúvidas sobre o NEM.
O que é o Novo Ensino Médio?
O Novo Ensino Médio surge a partir das alterações previstas na lei nº 13.415, de 2017.
O que muda com o Novo Ensino Médio?
A principal mudança é uma nova organização do currículo que, além da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), passa a oferecer os chamados Itinerários Formativos aos estudantes com o objetivo de complementar a grade curricular.
Como funciona o Itinerário Formativo do Novo Ensino Médio?
Segundo Ministério da Educação (MEC), os Itinerários Formativos são um conjunto de disciplinas, projetos e núcleos de estudos que os estudantes podem fazer durante os três anos do Ensino Médio e que resultam um complemento de 200 horas na carga horária.
De acordo com o MEC, o objetivo dos Itinerários Formativos é ampliar o currículo do estudante ao término do Ensino Médio.
O projeto prevê que os estudantes, a partir de seus gostos pessoais, possam montar uma grade complementar para que se amplie “perspectivas profissionais e aptidões”.
Quais são os Itinerários Formativos do Novo Ensino Médio?
Os Itinerários Formativos estão estruturados da seguinte maneira:
– Por área de conhecimento: aprofundar e ampliar aprendizagens em uma determinada área do conhecimento e sua aplicação em contextos diversos. O documento do MEC prevê “levar em consideração o contexto social de cada escola”.
– Formação Técnica e Profissional: preparar o estudante para o mundo do trabalho. Aqueles que optarem por formação técnica, recebem um certificado no término do Ensino Médio. Trabalha-se com a ideia de “prepara os estudantes para ingressar no mercado de trabalho sem a necessidade de um diploma universitário”.
– Integrado: combina áreas de conhecimento, que também podem ser complementadas com a formação técnica e profissional.
As áreas de conhecimento são:
– Linguagens e suas tecnologias;
– Matemática e suas tecnologias;
– Ciências da natureza e suas tecnologias;
– Ciências humanas e sociais aplicadas;
– Formação técnica e profissional.
Os Itinerários Formativos também estão organizados a partir de quatro Eixos Estruturantes:
– Investigação científica
– Processos criativos
– Mediação e intervenção sociocultural
– Empreendedorismo
São os estudantes que escolhem os Itinerários Formativos?
Sim, o aluno é responsável pela escolha dos Itinerários Formativos a parir de suas pretensões pessoais.
O estudante pode mudar de Itinerário Formativo ao longo dos três anos do Ensino Médio.
Qual é a carga horária do Novo Ensino Médio?
Segundo o MEC, o Novo Ensino Médio amplia a carga horária de 800h para 1.000h anuais e, ao término do Ensino Médio, totaliza-se um total de 3.000h.
Desse total de carga horária 1.800 horas são voltadas para a Formação Geral Básica e 1.200 para as Unidades Curriculares dos Itinerários Formativos.
O que dizem os defensores do Novo Ensino Médio?
Para os defensores do Novo Ensino Médio, o projeto visa tornar o ambiente escolar “menos chato” e “menos ultrapassado”.
Também comungam da ideia de que o Novo Ensino Médio “vai dar autonomia aos estudantes” e “prepará-los para o mercado de trabalho” ao oferecer formação profissionalizante.
Qual é o problema do Novo Ensino Médio?
Educadores e estudantes advogam que, ao contrário da propaganda, o Novo Ensino Médio vai “precarizar ainda mais” a educação básica e a formação dos estudantes.
Um dos exemplos citados é que disciplinas em torno da história, sociologia e filosofia são menos citadas – ou até mesmo não aparecem – nos currículos ofertados aos estudantes, porém não faltam menções a marketing e empreendedorismo, por exemplo.
Para os críticos do Novo Ensino Médio, os Institutos Federais já cumprem um papel de oferecer formação técnica aos estudantes recém formados e com qualidade pedagógica e curricular comprovada.
Mas qual é, afinal, o problema do Novo Ensino Médio?
Um extenso documento publicado pela Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), desmistifica a ideia de que o Novo Ensino Médio vai “tornar a escola mais atraente para os estudantes”.
O documento aponta algumas questões importantes para o debate:
– Não é a grade curricular que provoca a evasão escolar, mas sim condições socioeconômicas.
– O principal problema da escola pública não é curricular, mas sim falta de investimento em sua infraestrutura.
– O interesse dos estudantes não surge de forma espontânea e nem natural, eles são determinados, em grande medida, pelas condições de vida.
– “Organizar a educação a partir dos interesses dos jovens pode parecer uma forma de respeitar a liberdade de cada um, mas não é: significa naturalizar a desigualdade social que afeta a nossa juventude, reproduzindo-a para dentro da escola”.
Qual é o problema do Itinerário Formativo do Novo Ensino Médio?
Os educadores críticos do Novo Ensino Médio apontam para uma armadilha dentro do Itinerário Formativo: a Medida Provisória diz que as escolas poderão oferecer um ou mais itinerários formativos como opção aos estudantes, mas não diz que em cada escola haverá os cinco tipos de itinerários.
Ou seja, a escola em que determinado estudante está matriculado pode oferecer apenas um ou alguns desses itinerários, o que reduz a possibilidade de escolha do aluno.
Integrar educação básica com a profissional é ruim?
Novamente, para os educadores aqui reside outra armadilha: a MP do governo Temer não estabelece uma integração entre os dois modelos, o que ela faz é jogar a educação profissional para dentro da carga horária do ensino médio e, dessa maneira, substitui outros conteúdos (humanidades, por exemplo) nos Itinerários Formativos.
Educadores críticos ao NEM afirmam que essa mistura entre formação básica e profissional é o oposto dos projetos pedagógicos que buscam a integração, pois, ao invés de qualificar a formação geral dos estudantes, o NEM vai desqualificar a formação dos estudantes da rede pública e, de maneira ardilosa, trabalhar com a ideia de que os jovens não precisam de formação universitária para ingressar no mercado de trabalho.
Eis o principal problema do Novo Ensino Médio: aprofundar as desigualdades sociais e de formação entre os jovens pobres e de classe média frente aos das classes A e B que continuarão a ter clássica formação, mesmo dentro dos chamados Itinerários Formativos.
Por Marcelo Hailer