Ler romances sobre o cangaço, livros de autoria de historiadores e pesquisadores do assunto é enriquecedor para quem se interessa pela história do Nordeste e seu povo, mas o que emana dos debates travados em grupos de whatsApp em que eles, pesquisadores, historiadores, descendentes de cangaceiros, coiteiros e coronéis, enriquecem muito mais.

Esta crônica a seguir é resultados da garimpagem de um desses diálogos entre pesquisadores, dos quais me tornei acólito.

Reza a lenda que Massilon Leite, supostamente natural da região de Timbaúba dos Mocós(PE), chegou à região do sertão da Paraíba acompanhando os pais ainda na infância; na fase adulta teria sido “almocreve no trecho Mossoró(RN)/Brejo do Cruz/Pombal na Paraíba”; trabalhava em companhia de um irmão(alcunha Pinga-Fogo), que também ingressou no cangaço, segundo narrativa do pesquisador do cangaço, José Tavares.

Massilon Leite, chefe de bando

Sertanejo festeiro, bom dançarino de forró, almocreve,  Massilon costumava “pagar a conta” em bebedeiras em bodegas por onde passava para os amigos e farristas ao redor.

Inevitavelmente, uma mulher fatal surgiu pelas vereadas das caatingas atravessadas por por Massilon no trabalho de almocrevia.

Mulher fatal

Essa “mulher fatal” era uma ex de um soldado, o que causou uma disputa que levou a um entrevero, provavelmente em Brejo do Cruz, na Paraíba, vilarejo encantado e festejado nas músicas do cancioneiro Zé Ramalho.

Pesquisadores Ivanildo Silveira(E) e Zé Tavares na fazenda S. Miguel

Contenda por mulher se resolvia e ainda se resolve à bala ou em audiências judiciais.

Até que houve a oportunidade de um tête-à-tête entre Massilon e o militar que evoluiu para um tiroteio em que Massilon levou a melhor e o militar tombou morto.

O trabalho de almocrevia no Sertão não era uma tarefa para todos. Adestrar e controlar tropa de burros, comprar, transportar e comercializar de vilarejo em vilarejo, cidade em cidade, exigia muita coragem, habilidade com armas para se defender de salteadores, relacionar-se com coronéis, cangaceiros e volantes, tudo isso fazia parte da expertise de um almocreve.

Com o militar morto, Massilon passou a temer consequências naturais: prisão e até mesmo vingança por parte da família do soldado desventurado, que perdera a vida e a mulher.

Massilon buscou abrigo na fazenda de Joaquim (Quinca) Saldanha, considerado o maior coiteiro de bandoleiros na divisa entre Rio Grande do Norte e Paraíba – o que  significava praticamente virar cangaceiro.

O pesquisador Zé Tavares narra que “os bandoleiros procurados na Paraíba se homiziavam em fazenda de Quincas Saldanha no lado do Rio Grande do Norte; os procurados por lá eram abrigados em propriedades de Saldanha no lado paraibano”.

Massilon fez “carreira” não muito longeva no cangaço praticando assaltos e crimes de encomenda; arregimentou seu próprio bando. Participou de empreitadas com Lampião, mas não integrava o bando dos Irmãos Ferreira.

Onde Massilon e seu bando atuavam, aí tinha o dedo de Quincas Saldanha, inclusive um assalto a Apody e o fracassado ataque a Mossoró, pontua Zé Tavares.

Já o pesquisador Ivanildo Silveira narra que Quincas Saldanha tinha o apelido de Gato Vermelho, isso porque quando estava fulo da vida ficava vermelhão, tal qual  Clementino José Furtado, o Quelé, apelidado por Vigulino Ferreira de “Tamanduá Vermelho”.

Comando em mão dupla

Mas voltemos a Massilon.

Coube a ele, Massilon, comandar um dos subgrupos no assalto a Mossoró e liderar o ataque em parceria com Lampião que com o seu bando, antes mesmo de chegar a cidade, espalhava o terror saqueando fazendas e matando quem oferecesse obstáculo.

O ataque a Mossoró, todos sabem, fracassou.

Mas de quem foi à responsabilidade pelo fracasso, se o bando fora bem financiado por coronéis; estava bem municiado, preparado e em grande número?

O erro se deu no planejamento? Na juventude e inexperiência  de jovens comandantes como Virgulino e Massilon na liderança de mais de 50 bandoleiros bem municiados?

Difícil esclarecer, mas o certo é que o fracasso provocou racha nos grupos.

Na fuga atabalhoada para o Ceará o cisma entre os cangaceiros se acirrou, Massilon e seu pequeno grupo  romperam a associação para o crime com Lampião, passando a barbarizar no sertão cearense, enquanto Virgulino tomava outro rumo, de volta ao seu “reino” no Pajeú, para enfrentar implacáveis perseguições das volantes, especialmente do seu arqui-inimigo Clementino Quelé..

Por fim e não por último, Massilon fez seu “pé-de-meia” financeiro, assumiu nova identidade e se escafedeu no oco do mundo, migrando para o estado do Maranhão, onde foi assassinado.

A fama desse bandoleiro ainda pode ser conferida em relados orais nos estados da Paraíba, Ceará e Rio Grande do Norte.

-Ah! Massilon Leite é aquele que invadiu Mossoró? É expressão recorrente entre sertanejos na tríplice fronteira dos estados da Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará.

Evento Cariri Cangaço reúne pesquisadores e admiradores

Mossoró a cidade que botou Lampião pra correr! É o entendimento dos mossoroenses e de historiadores que advogam exclusivamente para Virgulino o protagonismo de comandante supremo de todos os cangaceiros.

Esta crônica cangaceira resultou de acompanhamento de debates de pesquisadores em grupo de WhatsApp.

Fonte: José Tavares, Ivanildo Silveira. Pesquisadores abalizados do Cangaço.

Imagens: Memorial Mossoró – A defesa

Encontros Cariri Cangaço Serra Talhada-Bom Nome 2022

One thought on “Massilon Leite e Virgulino comandam assalto a Mossoró”

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