José Tavares de Araújo Neto

A Emboscada de Água Branca, ocorrida em junho de 1930, tornou-se um dos episódios mais sangrentos da chamada Revolta de Princesa, conflito armado que opôs as forças do coronel José Pereira Lima – chefe político de Princesa Isabel, que proclamara a independência do município – e o governo paraibano liderado por João Pessoa Cavalcanti de Albuquerque.

A tensão que culminaria na emboscada tinha origem na resistência de José Pereira ao centralismo de João Pessoa, então presidente da Paraíba. Em Água Branca, pequeno povoado do sertão paraibano, as tropas pereiristas prepararam uma emboscada contra uma coluna policial enviada para reforçar o cerco sobre Princesa.

A repercussão foi imediata na imprensa nacional. O jornal A Noite (RJ), em 5 e 6 de junho de 1930, noticiava que a coluna policial, composta por 200 a 400 homens e transportada em 12 caminhões, caiu numa tocaia das forças de José Pereira. O resultado foi devastador: dezenas de mortos, caminhões incendiados e grande quantidade de armas e munições capturadas.

Entre os mortos, destacava-se o tenente Francisco Genésio, além de vários sargentos, cabos e soldados. Notícias relatavam inclusive que cerca de cinquenta soldados morreram;

O Jornal do Brasil (RJ) (6/06/1930) classificava o encontro como “sangrentíssimo”, destacando que os pereiristas, comandados por Marcolino Diniz e Luiz do Triângulo, ficaram senhores do campo de batalha. Já a Gazeta de Notícias (RJ) (18/06/1930) reforçava a dimensão da derrota policial, com novas contagens de cadáveres encontrados dias após o combate.

Os jornais registraram também a apropriação, pelos pereiristas, de 57 fuzis, 20 mil cartuchos e caminhões, apresentados como troféus de guerra. O episódio foi usado politicamente: o Diário Nacional (SP) (12 e 21/06/1930) publicou ordens de promoção militar assinadas por José Pereira, que elevou Luiz do Triângulo a major e João Paulino a capitão, transformando-os em heróis locais da causa princesense.

“Exército Libertador” como Ordem do Dia

A própria ordem do dia do chamado “Exército Libertador” exaltava o feito de Água Branca, e o município de Princesa chegou a instituir uma pensão para as famílias dos combatentes mortos.

Um detalhe curioso divulgado pela imprensa foi a presença, entre os mortos da coluna policial, de um feiticeiro alagoano chamado José da Silva. Segundo A Noite (23/06/1930), ele teria sido contratado pelo governo da Paraíba para, com rezas e passes, atrair José Pereira à captura. A notícia reforçava o caráter quase mítico atribuído ao episódio.

Outra consequência foi a deserção em massa. Muitos soldados abandonaram as armas e refugiaram-se em Pernambuco, recusando-se a retornar ao combate. O País (RJ) (9 e 10/06/1930) ressaltava o pânico e a baixa moral da tropa governista após a emboscada.

O massacre de Água Branca chocou a opinião pública. Para jornais como O País e a Gazeta de Notícias, a derrota fragilizava ainda mais o governo estadual, levantando a pergunta: até quando se prolongaria a guerra civil na Paraíba, que já somava centenas de mortos, comprometia o comércio e agravava a crise no Nordeste?

A Emboscada de Água Branca não foi apenas um episódio militar, mas também um acontecimento midiático, explorado pelos jornais como exemplo da brutalidade da guerra civil paraibana de 1930. A narrativa construída pela imprensa ajudou a eternizar a imagem de José Pereira e de seus comandados como resistentes que, em menor número, derrotaram a polícia estadual de forma retumbante.

Ao mesmo tempo, a tragédia expôs o drama humano dos soldados sacrificados em caminhões incendiados, nas águas do rio ou abandonados nos sertões, simbolizando o alto preço da luta política que antecedeu a Revolução de 1930 no Brasil.

# José Tavares é escritor e pesquisador do Cangaço e Revolta de Princesa.

Imagem: A União

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