A Pedra do Reino, em São José do Belmonte, Pernambuco, tem uma interface mística com a Paraíba; segundo o escritor paraibano Ariano Suassuna(1927-2014) são duas torres gêmeas com uma voltada para a Paraíba e a outra para Pernambuco; geograficamente a distância entre o município de Santa Inês, Paraíba, à São José do Belmonte, onde fica a famosa Pedra Bonita, é de 35 km; é lá onde a partir desta sexta-feira, 26, se realiza uma cavalgada bem ao estilo medieval.
São José do Belmonte, terra do tenente José Rufino, o maior matador de cangaceiros, se torna Armorial – a expressão contributiva mais forte do “arianismo” para a identidade nordestina.
Em João Pessoa, terra de Ariano, homenagens físicas são várias, inclusive dá nome a quatro teatros, mas fica em São José do Belmonte sua mais forte inspiração: A Pedra do Reino que gerou “O Romance D’a Pedra do Reino”, tendo como consequência o despertar cultural da população de São José do Belmonte em defesa de suas tradições.
A Cavalgada até a Pedra do Reino é multicolorida, alegorias ao “reino encantado” sebastianista e a manifestação folclórica dos bacamarteiros emociona. Vi uma dessas apresentações em Bom Nome, distrito de São José do Belmonte, durante o evento Cariri Cangaço, e pude ter uma compreensão mais clara daquela cidadela no período Lampiônico, que é muito posterior ao evento protagonizado por homens e mulheres negras naquelas duas torres.
Guerreiros da cultura nordestina
O folclorista Edvandro Serafim, assim descreve a magia dos bacamateiros: “ armas brilhantes e reluzentes, ricamente enfeitadas, fardados, geralmente de azul, a cor dos combates, e também homenagem a nossa senhora, organizados, com seus chapéus de couro com a aba virada ricamente enfeitados, ou Chapéus de palha com a aba virada e uma rosa enfeitando adentram na praça da cidade, dançando e fazendo coreografias cantando, acompanhados de sanfona triângulo e zabumba”.
Bacamarteiros em São José
Serafim vai mais além. “Não, Lampião não invadiu a cidade. São os bacamarteiros que iniciam sua linda apresentação em breve se iniciará os tiros estrondosos parecendo trovões em homenagem aos Santos, as festas juninas e a tradição seguido das piruetas dos bacamarteiros. Um folguedo com mais de 100 anos de tradição, de história e de cultura remontando a guerra do Paraguai onde os combates vitoriosos retornando da guerra com seus granadeiros iniciaram está linda tradição. Dando tiros com pólvora seca para dar graças por estarem vivos, pela colheita e homenagear os santos. Ficando esses tiros conhecidos como “tiro da paz,” pois comemora o fim da guerra, são tiros só com pólvora seca sem chumbo para não machucar mas comemorar, a alegria da vida”.
As torres gêmeas que inspiraram o teatro e a literatura
Forte Movimento Armorial tem seu castelo
Criado pelo escritor, poeta e dramaturgo paraibano, Ariano Suassuna, o Movimento Armorial obteve desdobramentos na música, teatro, literatura. Entretanto sua expressão de maior destaque arquitetônica, é o Castelo Armorial, em São José do Belmonte , distante 474 KM do Recife, na divisa com o município de Santa Inês(PB). Na verdade, uma casa transformada em castelo.
Símbolos do islamismo e cristianismo no castelo armorial
São José do Belmonte é referência nas obras de Ariano Suassuna e José Lins do Rego, porque é lá que se situa a Pedra do Reino – motivo de argumento para romances e peças de teatro.
A elaboração do projeto teve início no ano de 2002. Já o prédio foi construído entre os anos de 2007 e 2017 pelo empresário Clécio Novaes.
“Em uma de nossas conversas, Ariano me disse que já tinha visto tudo sobre o movimento armorial, menos uma arquitetura. Foi a partir daí que surgiu a ideia de criar o projeto do castelo. Quando eu disse a ele que iria construir ele não acreditou”, relata o comerciante.
Anjo vaqueiro recepciona turistas na entrada do Palácio
Quem entra fica impressionado com tamanha delicadeza e riqueza de detalhes. Cada centímetro do lugar tem uma história para contar. Tudo foi milimetricamente pensado e fundamentado na literatura. Assim como o movimento, a união entre o medieval, barroco, a cultura popular e o erudito são fortes em cada canto do castelo.
O palácio armorial tem mais de 15 metros de altura. Ele é reaberto ao público sempre na última semana de maio, período em que a cidade organiza sua cavalhada, também, inspirada por Ariano.
O palacete tem várias peças feitas regionais feitas em barro. Elas foram confeccionadas pelos artesãos de Tracunhaém.
“Tivemos um trabalho imenso para deslocar cada obra de arte. Elas evidenciam os personagens que ilustraram a obra ‘A Pedra do Reino e o príncipe do Vai e volta’, de Ariano”, relata, Clécio Novaes.
Editor do blog em expedição à Pedra do Reino
Pedra do Reino e Sebastianismo
Pedra do Reino na Serra do Catolé em São José do Belmonte(PE). Na virada do século XIX para o sec. XX, abrigou um Quilombo onde ocorreram os trágicos e sangrentos acontecimentos da “Pedra Bonita”. Fanáticos professavam a volta de Dom Sebastião, acreditavam num reino encantado. A pedra foi lavada com sangue de crianças e adultos sacrificados. Uma força policial de Serra Talhada acabou com o movimento.
A Pedra do Reino, vê-la ao longe, cruzar todo pátio onde estão as lumiaras, e mesmo passar por entre as duas torres; sendo conhecedor das suas implicações culturais e religiosas provocam emoções por conta da energia do lugar.
O lajedo faz uma interface com as lumiaras religiosas criadas e colocadas no local por Ariano Suassuna, quando secretário de Cultural de Pernambuco. 16 totens, esculturas – personagens sebastianistas – colocadas em círculo, algo como representando o sagrado e o profano.
São muitos os relatos de mortes voluntárias. Os rituais envolviam o consumo de bebidas que estimulavam os fiéis ao suicídio e ao sacrifício dos próprios filhos. Elas se jogavam do alto da Pedra, ou eram imoladas a golpes de facão; seus corpos largados no lajedo ao redor, dando o sentido de “lavar o altar com sangue”.
Crianças foram também sacrificadas. Cinquenta e três pessoas foram sacrificadas nos três dias da matança, incluindo a mulher do “rei”, a rainha Izabel.
O delírio místico do autointitulado rei João Antônio Ferreira teve seu ápice quando ele proclamou que a Pedra só se desencantaria quando lavada por sangue. Os sacrificados ressuscitariam poderosos e imortais.
Lampião nos arredores
A Serra do Catolé também foi palco de lutas entre cangaceiros e volantes. Baleado no pé, Lampião ficou nas cercanias da Pedra do Reino onde foi tratado pelo cangaceiro Cícero Costa, espécie de enfermeiro do bando, que foi morto pela volante do Clementino Quelé nas imediações durante a perseguição ao bando. A Pedra Bonita ou do Reino virou tema de romances de Zé Lins do Rego e Ariano Suassuna, mas o principal deles é Reino Encantado – Crônicas Sebastianistas, de Tristão de Alencar Araripe Júnior.
A Serra do Catolé também foi palco de lutas entre cangaceiros e volantes. Baleado no pé, Lampião ficou nas cercanias da Pedra do Reino onde foi tratado pelo cangaceiro Cícero Costa, espécie de enfermeiro do bando, que foi morto pela volante do Clementino Quelé nas imediações durante a perseguição ao bando. A Pedra Bonita ou do Reino virou tema de romances de Zé Lins do Rego e Ariano Suassuna, mas o principal deles é Reino Encantado – Crônicas Sebastianistas, de Tristão de Alencar Araripe Júnior.
Imagens João Costa
Imagens do Grupo folclórico; Edvandro Serafim